Mais do que os cinco sentidos: um
ensaio sobre a mulher e o indomável do feminino
Há coisas na vida que os cinco sentidos não dão
conta. Eles são, sim, portas poderosas: enxergam, tocam, provam, escutam,
cheiram. Mas tudo isso, por mais aguçado que seja, só alcança a pele do mundo.
O que é profundo, o que é essência, exige outro tipo de acesso. E é nesse ponto
que se encontra o mistério das mulheres.
Edson Marques, em um texto seu, no trecho que
inspira esta reflexão, diz: “Não me bastam os cinco sentidos para perceber-lhes
toda a beleza”. E é verdade. Porque não se trata apenas de ver um rosto bonito
ou ouvir uma voz suave. A mulher é um território de complexidades. É história,
é memória, é sonho, é força e vulnerabilidade ao mesmo tempo. Nenhuma retina,
por mais sensível, alcança tudo isso.
Um olhar superficial pode se deter nas curvas e nos
perfumes; um olhar profundo tenta entrar na alma. E para isso, não basta
enxergar: é preciso pressentir. Não basta ouvir: é preciso escutar o que não
foi dito. Não basta tocar: é preciso perceber o arrepio do silêncio.
A mulher é, antes de tudo, um universo. E quem
tenta reduzi-la ao que vê, perde-se. Ela carrega dentro de si gerações de
histórias, medos e coragem. Cada gesto tem uma origem antiga, cada palavra
carrega uma força que foi aprendida ao longo de séculos. Há dores guardadas que
os sentidos não captam. Há sonhos que só aparecem quando alguém olha sem querer
dominar.
E aqui está um ponto essencial: não se ama uma
mulher tentando explicá-la. Amar uma mulher é aceitar o mistério. É acolher
o fato de que há nela algo que ninguém jamais vai decifrar. Esse “algo” é a sua
liberdade de ser - livre até para mudar de rota a qualquer momento. Por isso,
um homem que realmente ama não tenta corrigir, moldar ou aprisionar. Ele dança
junto. Ele entra no sonho dela como quem entra numa música e se deixa levar.
Quando Edson Marques escreve “não lhes tiro a
liberdade, não quero mudá-las jamais”, ele toca naquilo que talvez seja o maior
respeito: permitir que a mulher seja um ser vivo em constante reinvenção. Nenhum
gesto é mais bonito do que este: olhar para uma mulher e dizer, em silêncio,
“eu te vejo como és, e é justamente assim que te quero”.
E há outra coisa importante: a mulher é um ser de
profundidades, mas também de superfície. É olhar, é pele, é sorriso. Não é um
enigma inalcançável; é um enigma disponível, mas que só se abre a quem sabe
chegar com delicadeza. Por isso, amar não é só contemplação: é participação. É
escutar suas histórias, beijar-lhe a boca e o riso, como diz o texto, entrar no
mundo dela como quem entra em um jardim que não é seu, mas onde é convidado a
caminhar.
Os cinco sentidos nos levam até a porta desse
jardim. Mas depois dela, só entram outros dois sentidos que não têm nome: o
sentido do respeito, e o sentido do assombro. O respeito, porque sem ele tudo
vira apropriação. O assombro, porque sem ele tudo vira costume, e costume mata
a beleza.
Há homens que envelhecem sem nunca perceber isso.
Passam pela vida colecionando conquistas, mas nunca entram de fato em ninguém.
Ficam na pele. E, ao final, descobrem tarde demais que a pele envelhece rápido,
mas a alma não.
E há outros - e Edson Marques se inclui nesse
segundo grupo - que entendem que amar uma mulher é um ato de admiração
contínua. Que cada olhar dela, mesmo depois de anos, é um lugar novo. Que a
beleza está no movimento, no sonho que ela sonha acordada, no fogo e na
suavidade que coexistem.
Por isso, talvez não baste um sexto sentido. Talvez
sejam necessários sete, oito, dez. Talvez a vida inteira seja pouco para compreender
uma única mulher. Mas não tem problema. O belo está em continuar tentando.
No fim, é isso: amar uma mulher é um exercício de humildade. Deixar que ela seja um espelho que nos mostra o que ainda não sabemos ver. e, por um instante, sentir que se entra num espaço sagrado, não para tomar posse, mas para agradecer.
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