sábado, 26 de julho de 2025

                 

PROCRASTINAÇÃO

Às vezes, a gente vive como se tivesse um estoque infinito de horas. Vamos empilhando adiamentos como quem guarda caixas no sótão, dizendo para nós mesmos: “mais tarde eu abro, mais tarde eu vejo, mais tarde eu vivo”. E assim a vida vai virando um eterno “depois”.

Mas o depois é uma ilusão confortável. Ele nos dá a falsa sensação de que temos domínio sobre o tempo, quando na verdade é ele que nos domina. Vamos deixando telefonemas para depois, visitas para depois, um abraço para depois. Deixamos aquele café com um amigo para depois, aquela palavra de gratidão para depois, o gesto de amor para depois. E, quando percebemos, o depois se transformou em nunca.

A procrastinação, essa arte tão disfarçada de racionalidade, parece inofensiva. “Vou fazer quando estiver mais tranquilo”, “quando sobrar tempo”, “quando as coisas acalmarem”. Só que esse tempo sereno que esperamos nunca chega. O mundo nunca para de girar para que a gente cumpra nossas promessas íntimas. E os adiamentos viram um hábito, um costume confortável e silencioso. Vamos nos acostumando a perder instantes preciosos, como se houvesse sempre um amanhã garantido.

Talvez seja por isso que a delicadeza seja tão revolucionária: porque ela pede presença. Bordar a vida - como quem dá ponto em um tecido áspero - exige parar, exige estar ali, naquele exato segundo. Não dá para bordar no futuro; só se costura no agora. O fio da delicadeza não aceita o compasso da pressa nem o adiamento das prioridades do coração.

É curioso como, quando olhamos para trás, quase sempre nos arrependemos mais do que deixamos de viver do que daquilo que fizemos. O abraço que não demos, a palavra que não dissemos, a visita que não fizemos. Quantos encontros guardamos no bolso para um depois que nunca existiu?

Por isso, talvez seja hora de um pequeno exercício: reinaugurar os gestos simples, sem calendário marcado. Borde companheirismo no presente. Borde atenção na conversa de agora. Borde cuidado no toque, no olhar, no tom de voz. Porque a vida não avisa quando muda de cor; ela apenas muda.

O depois é sempre incerto. Ele mora num lugar onde ninguém esteve ou conhece. É como um horizonte que parece perto, mas nunca se alcança. Já o agora - este minuto exato - é o tecido disponível, um tecido muitas vezes áspero, mas vivo. E nele dá para costurar delicadezas.

Que a gente aprenda a não esperar tanto. Que tenhamos a coragem de ser simples e gentis agora, antes que a vida nos escape por entre os dedos, deixando apenas a poeira dos “depois” que nunca vieram.

Uma linda tarde de Sábado pra você.

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